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sábado, 29 de outubro de 2011

Eu, meu amigo haitiano e o cosmopolitismo (Parte 2)

O que ele tem de tão diferente em sua essência que nos distancia?

Sim! - respondeu o estrangeiro, sorrindo como alguém que não absorve o calor e o humor de Manaus. Ao detectar o português imaturo de meu companheiro, perguntei quantos idiomas falava. Conversamos então mais de uma hora em espanhol, o que lhe provocou uma alegria provavelmente desencadeada pela minha atenção extra e incomum por aqui. Você é daqui? - indagou o Haitiano. Sí! - respondi em espanhol mostrando impaciência com seu português insistente e enrolado.

Ele revelara que no caminho da vinda para Manaus, tinha parado no Equador por 6 meses onde aprendeu a língua espanhola. Relatou que ele e seu grupo enfrentaram o frio forte do Equador e só depois vieram para Tabatinga. 

No momento, ele estava ali nas redondezas borbulhantes de Manaus para uma reunião no Shopping Center. Depois de um silêncio entre o brasileiro e o haitiano que conversavam em espanhol, fizera eu uma afirmação sincera, mas polêmica:

- Algumas pessoas aqui são contra a vinda de vocês. 

Com um sorriso desconfiado, ele perguntou inocentemente o porquê.

- Dizem que estão trazendo mais problemas, inclusive podendo ocupar as oportunidades de trabalho que são de amazonenses. - continuei.

Ainda com um olhar de desinformado, ele parecia não acreditar.

- Mas eu discordo sabe, acredito que todos tem a capacidade de disputar sua oportunidade no mercado de trabalho, só depende de cada um se qualificar...

O Haitiano voltou a rir como se tratasse minha informação com tamanho desdém, o que de certa forma me deixou menos constrangido. Ele afirmou que não sabia daquilo e reforçou o esforço e sofrimento pelo qual eles passaram e mostrou que Manaus era a nova chance da vida deles. Lembrou que nem todos que chegaram eram de bom caráter e se revelou bastante grato com o trabalho feito pela Paróquia São Sebastião do Padre Jelmino Costa na chegada de seu grupo.

Entre outros papos que foram de futebol até mulheres, conversamos como antigos amigos e pude perceber que julgar sem conhecer é uma armadilha. A questão humana sempre fala mais alto e isso foi o mais importante que extrai dessa experiência. Por outro lado, entendo que é algo novo para o povo do Amazonas, especialmente para Manaus, mas como alguns dizem que aqui é um lugar acolhedor, só o tempo mostrará. Costumo não me agradar com generalizações, principalmente relacionadas a costumes e opiniões, o que na minha cabeça se classifica como lenda urbana, mas repito, só o tempo mostrará.

A importância dessa história contada em primeira pessoa é para aproximar eu, você e o haitiano, e mostrar que algumas das citações contadas ao Haitiano foram passadas por pessoas respeitadas e de muito bagagem e conhecimento, mas que do meu ponto de vista se diminuíram por perderem o cuidado na comparação entre a terra e o homem. Afinal, cantamos uma música na direção de uma bandeira, beijamos um tecido verde e amarelo, juramos amor à pátria, um amor que de tão endeusado parece programado e planejado; fazemos tudo isso às vezes por questões de protocolo e ordem mas pensamos duas vezes em estender a mão a um ser humano por ser estrangeiro? O que ele tem de tão diferente em sua essência que nos distancia? Cultura, religião e idioma? Cor da pele? Por que temos um nacionalismo tão exagerado? Divisões e demarcações? Desigualdade social por questões abstratas? VOCÊ JÁ PAROU PARA PENSAR NISSO? 

Kako Menezes




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